Na Minha Onda - Laura Conrado

Vitória Prata já foi uma cantora de muito sucesso, mas pra seguir seus sonhos ela desfez a dupla As Elétricas com a melhor amiga, Carol Laine, e foi tentar uma carreira solo com mais identidade musical. Não deu certo. Os 2 anos em São Paulo a relegaram ao esquecimento, mesmo que tenha crescido musicalmente. Derrotada e de volta a Salvador, ela contabiliza vários fracassos e uma dívida que só cresce no cartão de crédito.

Eis que Carol Laine ressurge, toda cheia de sorrisos e coração aberto, convidando a amiga pra participar de um reality show sobre a sua vida. Vitória relutou um pouco, imaginando as piores intenções, mas acabou topando. E isso fez sua vida mudar, fazendo sucesso de novo. Só que a felicidade... essa é um pouco mais difícil de alcançar.

Talvez por isso eu esteja tão fissurada nos corações do Instagram: porque o meu não curte nada do que eu ando fazendo. Todos dizem que eu estou linda, mas não me sinto bonita. Tenho o namorado que sempre sonhei, mas não sinto o amor. Tenho dinheiro, mas não realização. Continuo me sentindo em segundo lugar numa competição comigo mesma.

Vitória é muito insegura e imatura. Não se abre com as pessoas e acha que todas estão fazendo que nem ela, escondendo suas verdadeiras intenções. Duvida de sua melhor amiga, não se dá bem com a irmã, vê o lado negativo de tudo. Ela é um pouco chata, pra falar a verdade. E o pior é que isso é crível, existem mesmo pessoas assim no mundo.

Essa é uma característica dos livros da Laura. Suas protagonistas não são do tipo que você se apaixona e de tão legal acaba perdoando os defeitos. Ela traz mulheres de verdade, que podem muito bem ser eu e você - e sim, isso incomoda, mesmo quando a gente se reconhece na personagem. Em alguns momentos me identifiquei com Vitória e vibrei com suas conquistas, tentando ter empatia; em outros tive que dar razão a cada palavra grossa dita a ela, porque merecia ouvir mesmo.


O alívio veio com  Janaina, uma amiga deficiente visual que é a voz da razão, aquela que fala tudo que eu queria berrar nos ouvidos de Vitória. Seja dando esporro, dando uma chacoalhada em forma de incentivo, ela me representou!

Mas voltando à história, tem um romancezinho, mas não é o foco do livro (outra coisa marcante da autora - colocar o amor como parte da vida, não como objetivo). E vou te falar... que mulher neurótica! Era de revirar os olhos cada ceninha de desconfiança ou exagero. Pelo menos tinha o Lucas pra dar aquela aliviada. #ursinho

Você é a melhor saudade que cultivei, porque até a sua falta me inspira.

Gostei muito do livro ser bem brasileiro, com muitas referências a lugares e pessoas. A religião e a culinária, tão características da cultura baiana, também se fazem presente. Além disso, Laura explora bastante o contexto atual, citando, por exemplo, as confusões do Oscar e do Miss Universo e a série de TV How to get away with murder.

Gostei mais ainda das críticas aos padrões de beleza e felicidade que a mídia insiste em pregar. Vitória fazia de tudo pra ficar mais bonita, mas nem os tratamentos estéticos, a dieta maluca ou as megaproduções de roupa, cabelo e make serviam pra deixá-la com autoestima em alta. Ela almejava o estrelato, mas dinheiro, fama e badalações não preenchiam o vazio. Isso tudo coloca o leitor pra refletir sobre o que realmente é importante na vida de uma pessoa, condenando esse consumismo louco.

Por que essa Vitória gente boa, que ama música e só quer ser feliz não fica dentro de mim pra sempre? Por que a Vitória ávida por atenção, carente, insegura e competitiva insiste em querer comandar minha vida?

E o desfecho é redentor! Mais uma das coisas que me fazem amar as histórias da Laura. Ela tem uma pegada feminista muito forte, e aqui, especialmente, tem muito empoderamento e sororidade. Competição, obsessão com a beleza, preocupação em agradar os outros? Vitória e Carol Laine mostram que é possível transformar tudo isso em muita autoafirmação, solidariedade e amizade.

Minha única "chateação" foi que eu saquei o mistério bem no começo. Não sei se é previsível mesmo ou se eu que cismei com a pessoa certa. Mas de toda forma essa foi uma das inovações da autora, que antes usava e abusava do chick-lit e agora se arriscou a colocar uma pitadinha de suspense na obra, o que me surpreendeu bastante.


Aaaaah! Não posso deixar de comentar sobre a música Filme de Amor, que saiu das páginas e foi parar no Spotify! Você pode ler os versos que Vitória compôs e depois correr pra escutar como eles são de verdade. Acho digno Ivete, Daniela, Claudinha ou alguma dessas agitadoras de trio elétrico incluírem no repertório pro Carnaval 2018. Pra ficar ainda melhor, A Globo Alt fez uma playlist do livro, com muito axé e todas as músicas citadas no livro. Mara, né?!

Falando em GloboAlt, o trabalho deles foi lindo! Muito capricho na capa, na diagramação e na divulgação. Esse caderninho é puro amor, e as artes pras redes sociais tão uma melhor que a outra.

Eu sou bem suspeita pra falar dos livros da Laura porque tenho um carinho especial por ela desde o primeiro livro (aproveitem pra ler as resenhas dos outros aqui: Freud, me tira dessa!, Só gosto de cara errado, Shakespeare e Elas, Quando Saturno Voltar, Bela Nada Adormecida). E justamente por isso é tão legal acompanhar o amadurecimento tanto da escrita quanto da autora.

Tira o pé do chão, bate na palma do mão e vai no ritmo da folia correr pra ler Na Minha Onda! Você também vai querer devorar o livro e ficar louco pra dar um pulinho em Salvador. ;)


Na Minha Onda - Laura Conrado
Globo Alt
288 páginas
Livro cedido pela editora
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